Encontro 25 de junho de 2013
O Seminário com o tema "educação inclusiva" foi promovido com a participação da APAE de Buritis - Minas Gerais, Secretaria Municipal de Educação, Prefeitura Municipal de Buritis, com a explanação do conteúdo "Educação Inclusiva", com a Senhora Leandra representando a APAE de Buritis, que muito contribuiu com o foco do assunto despertando a todos para refletir sobre a situação da realidade da inclusão em Buritis, no Brasil e no mundo.
Breve reflexão de como era a inclusão antes e depois.
*O que
era*
A deficiência mental coloca em xeque a função
primordial da escola comum que é a produção do conhecimento, pois o aluno com
essa deficiência tem uma maneira própria de lidar com o saber que,
invariavelmente, não corresponde ao ideal da escola. Na verdade, não
corresponder ao esperado pode acontecer com todo e qualquer aluno, mas os
alunos com deficiência mental denunciam a impossibilidade de atingir esse
ideal, de forma tácita. Eles não permitem que a escola dissimule essa verdade.
As outras deficiências não abalam tanto a escola comum, pois não tocam no cerne
e no motivo da sua urgente transformação: entender a produção do conhecimento
acadêmico como uma conquista individual.
O aluno com deficiência mental tem dificuldade
de construir conhecimento como os demais e de demonstrar a sua capacidade
cognitiva, principalmente nas escolas que mantêm um modelo conservador de
atuação e uma gestão autoritária e centralizadora. Essas escolas apenas
acentuam a deficiência e, em conseqüência, aumentam a inibição, reforçam os
sintomas existentes e agravam as dificuldades do aluno com deficiência mental.
Tal situação ilustra o que a definição da Organização Mundial de Saúde - OMS de
2001 e a Convenção da Guatemala acusam como agravante da situação de
deficiência.
O caráter elitista, meritocrático,
homogeneizador e competitivo dessas escolas oprimem o professor e o reduz a uma
situação de isolamento e impotência, principalmente frente aos seus alunos com
deficiência mental, pois são aqueles que mais amarram o desenvolvimento do
processo escolar, em todos os seus níveis e séries. Diante disso, a saída
encontrada pela maioria desses professores é desvencilhar-se desses alunos que
não acompanham as turmas, encaminhando os para qualquer outro lugar que
supostamente entenda como ensiná-los.
O número de alunos categorizados como
deficientes mentais foi ampliado enormemente, abrangendo todos aqueles que não demonstram
bom aproveitamento escolar e com dificuldades de seguir as normas disciplinares
da escola. O aparecimento de novas terminologias e outras contribuem para aumentar
a confusão entre casos de deficiência mental e aqueles que apenas apresentam
problemas na aprendizagem, por motivos que muitas vezes são devidos às próprias
práticas escolares.
Caso as escolas não mudarem, essa situação de
excludência generalizada tenderá a aumentar, provocando cada vez mais queixas
vazias e maior distanciamento da escola comum desse aluno que supostamente não
aprende.
O desconhecimento e a busca de soluções
imediatistas para resolver a premência da observância do direito de todos a
educação fez com que algumas escolas procurassem soluções paliativas, que
envolvem todo tipo de adaptação: de currículos, de atividades, de avaliação, de
atendimento em sala de aula que se destinam unicamente aos alunos com
deficiência. Essas soluções continuam mantendo o caráter substitutivo da
Educação Especial, especialmente quando
se trata
de alunos com deficiência mental.
Tais práticas adaptativas funcionam como um
regulador externo da aprendizagem e estão baseadas nos propósitos e
procedimentos de ensino que decidem “o que falta” ao aluno de uma turma de
escola comum. Em outras palavras, ao adaptar currículos, selecionar atividades
e formular provas diferentes para alunos com deficiência e/ou dificuldade de
aprender, o professor interfere de fora, submetendo os alunos ao que supõe que
eles sejam capazes de aprender.
*O que precisa ser*
Na concepção inclusiva, a adaptação ao
conteúdo escolar é realizada pelo próprio aluno e testemunha a sua emancipação
intelectual. Essa emancipação é conseqüência do processo de auto-regulação da
aprendizagem, em que o aluno assimila o novo conhecimento, de acordo com suas possibilidades
de incorporá-lo ao que já conhece.
Entender este sentido emancipador da adaptação
intelectual é sumamente importante para o professor.
Aprender é uma ação humana criativa,
individual heterogênea e regulada pelo sujeito da aprendizagem,
independentemente de sua condição intelectual ser mais ou ser menos
privilegiada. São as diferentes idéias, opiniões, níveis de compreensão que
enriquecem o processo escolar e que clareiam o entendimento dos alunos e
professores – essa diversidade deriva das formas singulares de nos adaptarmos
cognitivamente a um dado conteúdo e da possibilidade de nos expressarmos abertamente
sobre ele.
Já ensinar é um ato coletivo, no qual o
professor disponibiliza a todos alunos sem exceção um mesmo conhecimento.
Ao invés de adaptar e
individualizar/diferenciar o ensino para alguns, a escola comum precisa recriar
suas práticas, mudar suas concepções, rever seu papel, sempre reconhecendo e
valorizando as diferenças.
As práticas escolares que permitem ao aluno
aprender e ter reconhecidos e valorizados os conhecimentos que é capaz de
produzir, segundo suas possibilidades, são próprias de um ensino escolar que se
distingue pela diversidade de atividades. O professor, na perspectiva da
educação inclusiva, não é aquele que ministra um “ensino diversificado”, para
alguns, mas aquele que prepara atividades diversas para seus alunos (com e sem
deficiência mental) ao trabalhar um mesmo conteúdo curricular. As atividades
não são graduadas, para atender a níveis diferentes de compreensão e estão
disponíveis na sala de aula para que seus alunos as escolham livremente, de
acordo com o interesse que têm por elas.
Para exemplificar essa prática consideremos,
por exemplo, o ensino dos planetas do sistema solar para uma turma de alunos
com e sem deficiências. As atividades podem variar de propostas de elaboração
de textos; construir maquetes do sistema planetário; realizar pesquisas em
livros, revistas, jornais, internet; confeccionar cartazes; fazer leitura
interpretativa de textos literários e poesias; realizar de um seminário com
apresentação do tema; dentre outras. O aluno com deficiência mental, assim como
os demais colegas, escolhe a atividade que mais lhe interessar, pois a sua
capacidade de desempenho e dos colegas não é pré-definida pelo professor. Essa
prática é distinta daquelas que habitualmente encontramos nas salas de aulas, nas
quais o professor escolhe e determina uma atividade para todos os alunos
realizarem individualmente e uniformemente, sendo que para os alunos com
deficiência mental ele oferece uma outra atividade facilitada sobre o mesmo
assunto ou até mesmo sobre outro completamente diferente.
Contraditoriamente essa prática
discriminatória tem sido adotada para se impedir a “exclusão na inclusão”.
Utilizando como exemplo esse mesmo conteúdo - o ensino dos planetas do sistema
solar, é comum o professor selecionar uma atividade de leitura e interpretação
de textos para todos os alunos cabendo àquele com deficiência mental apenas
colorir um dos planetas.
Modificar essa prática é uma verdadeira
revolução, que implica em inovações na forma de o professor e o aluno avaliarem
o processo de ensino e de aprendizagem. Ela desmonta de uma só vez o caráter
homogeneizador da aprendizagem e elimina todas as demais características
excludentes das escolas comuns que adotam propostas pedagógicas conservadoras.
A prática escolar inclusiva provoca necessariamente a cooperação entre todos os
alunos e o reconhecimento de que ensinar uma turma é, na verdade, trabalhar com
um grande grupo e com todas as possibilidades de se subdividi-lo. Dessa forma, nas
subdivisões de uma turma, os alunos com deficiência mental podem aderir a
qualquer grupo de colegas, sem formar um grupo à parte, constituído apenas de
alunos com deficiência e/ou problemas na aprendizagem.
Para conseguir trabalhar dentro dessa proposta
educacional, o professor precisa contar com o respaldo de uma direção escolar e
de especialistas (orientadores, supervisores educacionais e outros), que adotam
um modo de gestão escolar, verdadeiramente participativa e descentralizada.
Muitas vezes o professor tem idéias novas para colocar em ação em sua sala de
aula, mas não é bem recebido pelos colegas e pelos demais membros da escola,
devido ao descompasso entre o que está propondo e o que a escola tem o hábito
de fazer para o mesmo fim.
Por outro lado, a receptividade à inovação
anima a todos a criar e ter liberdade para experimentar alternativas de ensino.
Essa autonomia para criar e experimentar coisas novas será naturalmente
extensiva aos alunos com ou sem deficiência. Assim, os alunos com deficiência
mental serão naturalmente valorizados pelo reconhecimento de suas capacidades e
respeito à suas limitações.
Essa liberdade do professor e dos alunos de
criarem as melhores condições de ensino e de aprendizagem, não dispensa um bom
planejamento de trabalho, seja ele anual, mensal, quinzenal ou mesmo diário.
Ser livre para aprender e ensinar não implica numa falta de limites e regras ou
ainda cair em um espontaneismo de atuação. O ano letivo, assim como a rotina
diária de uma turma deve contemplar um tempo para planejar, outro para
executar, outro para avaliar e socializar os conhecimentos aprendidos. Todo
esse processo é realizado coletivamente e individualmente. Um exemplo de rotina
de sala de aula, seria desenvolver num primeiro momento o planejamento
coletivo, que compreende uma conversação livre entre o professor e seus alunos
a respeito do emprego do tempo naquela jornada. Esse momento permite ao aluno
expressar-se livremente a respeito do que pretende fazer/aprender nesse dia e a
professora colocar suas intenções no mesmo sentido, estabelecendo um acordo
entre ambos. Esse momento todo o grupo pode tomar decisões com relação às atividades
e os grupos a serem formados para realizá-las. Num segundo momento as
atividades são realizadas conforme o plano estabelecido. Finalmente a jornada de
trabalho é reconstituída na última parte dessa rotina, com participação de
todos alunos que socializam o que aprenderam e avaliam a produção realizada.
O aluno
com deficiência mental participa igualmente de todos esses momentos:
planejamento, execução, avaliação e socialização.
A
avaliação dos alunos com deficiência mental visa ao conhecimento de seus
avanços no entendimento dos conteúdos curriculares durante o ano letivo de
trabalho, seja ele organizado por série ou ciclos. O mesmo vale para os demais
alunos, para que não sejam feridos os princípios da inclusão escolar. A promoção
automática exclusiva para alunos com deficiência mental constitui uma
diferenciação pela deficiência, o que caracteriza discriminação. Em ambos os
casos, o que interessa para que um novo ano de estudos se inicie é o quanto o
aluno com ou sem deficiência, aprendeu no ano anterior, pois nenhum conhecimento é
aprendido sem base no que se conheceu antes. Fotos do encontro.